“⦿”
Curadoria Catarina Duncan
Artistas: Abdias Nascimento, Aline Motta, Antonio Pichillá, Cabelo, Camila Mota, Cristiano Lenhardt, Dan Coopey, Frederico Filippi, Ismael David, MAHKU – Movimento dos Artistas Huni Kuin, Mariana de Matos, Moisés Patrício, Mônica Ventura, Raphael Escobar, Rodrigo Bueno, Vania Medeiros e Vivian Caccuri (Colaboração de Arto Lindsay).
A Galeria Leme apresenta a exposição coletiva “⦿“, com curadoria de Catarina Duncan. Direcionada por uma pesquisa em torno do uso de símbolos como ferramentas de linguagem, a mostra apresenta obras de dezessete artistas para construir um campo imaginário onde símbolos se sobrepõem à palavra escrita para comunicar tanto questões políticas quanto as relações entre o ser humano, o oculto e o desconhecido.
De acordo com Carl G. Jung no livro O Homem e seus Símbolos, “o que chamamos de símbolo é um termo, um nome ou imagem que nos pode ser familiar na vida diária embora possua conotações especiais além do seu significado evidente e convencional. Implica alguma coisa vaga, desconhecida ou oculta para nós.” Ou seja, evocar o simbólico nos coloca diante de um processo de desaprendizagem, daquilo que não podemos definir ou compreender integralmente.
O título da exposição “⦿” remete ao símbolo utilizado para identificar o Sol, que em muitas culturas é compreendido como o indefinível ou a manifestação do divino. Seu simbolismo é tão diversificado quanto as contradições de interpretação do Sol – fonte de luz que além de vivificar, torna as coisas perceptíveis, contendo sempre algo que não pode ser explicado pelas vias da razão. “⦿” é também um círculo e um ponto, com propriedades simbólicas de perfeição, homogeneidade e indivisibilidade, posto que não tem começo e nem fim, o que o aproxima do conceito de tempo circular. O objetivo é ter a circulação do simbólico como uma proposta de reorganização estrutural e temporal.
Dessa forma, toda a expografia foi pensada a partir da ideia de uma relação entre dois mundos, físico e espiritual, tendo como referência duas obras: ‘Ovo Bomba’ (2018), do artista Cabelo, e ‘Corpo Celeste’ (2018), da artista Aline Motta. A primeira é um ovo oco vermelho pintado com símbolos, como uma serpente preta, tendo em seus hemisférios escritas as palavras Yorubá ‘Ayê’ (mundo físico) e ‘Orum’ (mundo espiritual). A palavra ‘bomba’ do título traz a iminência de explosão e a obra pode de fato ser aberta e experimentada pelos visitantes. A segunda é pensada a partir do cosmograma Bakongo, referência ancestral da cultura Kongo do Oeste Africano. A obra, impressão sobre tecido, expõe também a relação entre ‘Nseke’ (mundo físico) e ‘Mpemba’ (mundo espiritual).
Uma das principais fontes de pesquisa para a exposição foi a obra do artista plástico e ativista Abdias Nascimento, presente com a obra ‘Quilombismo (Exu e Ogum)’ (1980), pintura cujo fundo é dividido em verde e vermelho, as mesmas da bandeira pan-africanista, ícone do movimento intelectual que reforça os laços de todos os povos da Diáspora Africana. Sobreposto a essas cores estão os instrumentos dos orixás Exu e Ogum, unindo os princípios da comunicação, da contradição e da dialética (Exu) com os da inovação tecnológica e dos compromissos de luta (Ogum). O titulo remete a um projeto politico de reorganização governamental antirracista, capitalista e neocolonial. Essa obra resume o encontro de símbolos religiosos e políticos, traçando um manifesto por vias simbólicas.
As obras escolhidas são atravessadas por dimensões alegóricas, míticas, intuitivas e políticas e se utilizam de símbolos para emanar novas ideias e propostas de existência e relação. A prevalência do símbolo sobre a palavra é uma proposta de alternância de poder, para que novas ferramentas de luta e comunicação possam ser desenvolvidas em um mundo onde a escuta se faz cada vez mais escassa.
Sobre o Curador:
Catarina Duncan (Rio de Janeiro, 1993) vive em São Paulo. Atua como curadora e programadora cultural. Formada em Culturas Visuais e História da Arte pela Goldsmiths College, University of London (2010 – 2014). Integrou a equipe curatorial da 32a Bienal de São Paulo, ‘INCERTEZA VIVA’ (2015 – 2016) e do ‘Pivô Arte e Pesquisa’ (2014-2015). Foi assistente de curadoria, para as exposições ‘Terra Comunal Marina Abramovic’ no Sesc Pompéia (2014), ‘Alter-Heróis’ no MAC – USP Ibirapuera (2014) e “Still Being” do artista Antony Gormley no Centro Cultural Banco do Brasil (2012). Participou das residências artísticas Lastro Travessias Ocultas na Bolivia (2016- 2017) e Lastro Centro América na Guatemala (2015-2016). Além de curadora convidada das exposições ‘Lastro em Campo – percursos ancestrais e contemporâneos’, no Sesc Consolação (2016), e ‘Travessias Ocultas – Lastro Bolivia’, no Sesc Bom Retiro (2018), assinou a curadoria de ‘Fio Corpo Terra’ no espaço Saracura (2017), ‘oráculo piedoso’ de Martin Lanezan na Galeria Sancovsky (2018), ‘é.é.é’ da artista Manoela Medeiros no projeto Zip’Up (2015) e ‘Pai dos Burros’ de Teresa Berlinck e Julio de Paula na Oficina Cultural Oswald de Andrade e no Sesc Rio Preto (2016 e 2018).
Agradecimentos: Galeria Leme e Catarina Duncan agradecem a colaboração e suporte de IPEAFRO, MAHKU, galerias A Gentil Carioca, Fortes D’Aloia & Gabriel e Marilia Razuk, além de todos os artistas que gentilmente aceitaram participar do projeto.
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